segunda-feira, 24 de novembro de 2008

1º Trabalho de casa II

O meu olhar é nítido como um girassol;
surpresas e confusas só as folhas
nos gestos recusando o que é desfeito,
flor de círculos descompondo a Natureza
revirando rosto de abelhas,
pétalas chama de cabelos,
no crepúsculo deciso dos poentes!

Nunca são as coisas mais simples que aparecem,
aos futeis, vulgares, distraídos,
imaturos eremitas parasitas de sinais...
redondos, concretos, cinzentos, inequívocos de ocasos
nos limites, nas fronteiras dos Invernos, dos Estios;
frios, muito frios... quentes, calores demais!

Quando não se conhece a Primavera
nada se escuta, nada se vê ...
até a voz do mar se torna exílio!

Belas são as flores, os rosas dos flamingos,
os bagos de romã, os voos da cotovia,
os restos dos ramos nas camas dos ninhos
das aves, quando as esperamos
antes dos frutos, nas beiras dos caminhos.

Nos campos de girassol
o meu amor não tem o medo dos grãos,
das mãos terra de raízes;
afasta as mousses dos vestidos
descobre-se na descida dos caules
transparece sorrisos de semente
no interior do meu peito.

Belos são os ventos, as melodias, os bailados
das folhas, dos ouriços dos castanhos...
e os dois corpos, longe dos olhos
estranhos, presos nos seus
sussurros de ventres, desejos repartidos...
e o sabor silvestre das amoras,
os figos de mel por entre filtros
de caruma...
a brisa do fundo da terra
que inebria de sopros, apruma,
a nitidez do girassol...

Nada mais tem
importância nenhuma!

4 comentários:

auxília disse...

Gosto do modo como mistura as sensações. Parabéns. Venho sempre aqui espreitar, mesmo quando o tempo me limita. Abraço.

M. disse...

Há um paralelismo muito bonito entre a espontaneidade da natureza que é fértil e abundante e um amor que também ele transborda e se confunde entre o frutos e os aromas inebriantes. Linda a passagem "(...) transparece sorrisos de semente no interior do meu peito"....como se o amor se semeasse e colhesse. O amor fértil que brota como a natureza alheio aos distraidos que falham a estação e não lhe encontram o calor. Gostei mesmo muito.

Joana Espain disse...

Este poema é como um novelo à volta do primeiro verso. Está muito bonito. Adorei o esmiuçar do olhar nítido como um girassol, o que nele há de nítido e a entropia das folhas de dúvidas. Somos então arrastados para essa entropia, como se nos desfolhássemos em sensações igualmente desordenadas da Natureza, sendo que no meio é explicado que o amor não tem medo do caos e vai afastando tudo para chegar ao interior do peito. E então percebemos no fim que o que há de nítido no girassol é o genuíno do amor e só isso interessa. Fez-me lembrar aquele poema da Magnólia da Luísa Jorge Neto pela exaltação do desfolhar (apesar de não ser a palavra neste caso). Parabéns.

Ana Luísa Amaral disse...

Já falámos deste poema na sessão! Uma nota só: Joana, tem razão quanto a Luiza...