Cruzam os dedos
o dia e a noite, inseparáveis.
Traçam
um círculo: a linha da vida
que nos inscreve. Olham
como eu sussurro ao teu ouvido
palavras de amor, macia
sumaúma com que encho
a almofada onde
repousas a cabeça. Digo:
“Quanto mais te amo, mais
te amo.” A tua cabeça
comprime as palavras, sob
o peso elas cantam. Afinal
o amor tem um rosto perene,
uma espessura, paredes
de uma casa litoral, voz
que nos caminhos do corpo
se insinua
descendo pela chuva, os dias
que a vida possa ter
sob um telhado azul, braços
para embalar, para dormir.
Os lábios movem-se nos lábios.
As aves recolheram
a semente das lágrimas. Inseparáveis,
a noite e o dia cruzam
os dedos. Olham. Traçam
o círculo, desenham
a linha de vida do amor. Vamos
percorrê-la. Seguir-lhe o rumo,
o subtil rumor.
Construir o percurso
até ao osso do tempo.
Egito Gonçalves In A FERIDA AMÁVEL , Campo das Letras, 2000
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segunda-feira, 23 de julho de 2012
Cruzam os dedos - um poema de Egito Gonçalves
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