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Miguel Ângelo
quando em outubro te abraço os braços que me estendes
guardo as lágrimas da génese como uma chuva de pérolas
e agradeço-te tudo quanto sinto desde o ser pequenino
vestir calções e enrolar-me nos teus ramos de árvore gigante -
fazes anos, nascemos no mesmo mês e em anos tão diferentes
e sinto mais os ossos agudos os ombros descaídos a doçura das rugas
quando em Outubro abres o sorriso e nos teus olhos de água
corre um rio -
um pai mais de cidades do que campo, na pressa de ser presente
quando as obrigações te afastavam o horizonte
de tantos dedos de vários tamanhos dos maiores aos mais pequenos -
chegavas pelo fim das tardes de Outono carregado de maçãs
golden, stark, bravo, impregnando de aromas os corredores
a alma que não consigo segurar
e ainda me salta, ao fim de tantos anos -
sentavas-te a meu lado na mesa grande da sala, nas tardes de domingo
e lentamente nos cadernos de duas linhas ensinavas caligrafia
os ós redondos de lacinho os tês pequenos de tracinho
os és elegantes grandes tão difíceis -
no dia seguinte ao dia dos teus anos quando te encontras longe
posso deixar correr nos olhos esta água miudinha, este sal precioso
e dizer-te o tanto quanto te quero, o quanto te agradeço
mesmo que não ouças e esteja frio e haja vento
mas junto de ti para sempre -
José ferreira 31 de Outubro de 2011
(este é um poema que dedico ao meu pai no dia seguinte ao dia dos seus anos)