sábado, 17 de janeiro de 2009

Óleo de amêndoas (agri)doces

Na primeira fase do grupo de trabalho poético acabei por ficar preso a um dos desafios da Ana Luísa. A inversão dos papéis e tentar a interpretação
do género, o colocar-nos na pele. Esse foi um chamamento que me tocou e uma experiência que ficou nos poema que, a partir dessa data, em resposta
ao meu nome de José passei a intitular como os poemas que assino como "Maria-" e começou com o das "Três Marias". Este que aqui vos deixo é mais um.

Óleo de amêndoas (agri)doces

Como se perde alguém
quando nasce uma criança?
- sem estar previsto
como obelisco, sílex de lança
pedra lascada de parto
quando sémen mal guardado
desiquilibra o amor, ameaça
o namoro na balança.

As águas revoltas do choro
que emerge e cansa na hora
dos sonhos, teima o dia.
Aperta o autocolante
de uma fralda tingida, amarela.
Ilumina o pó branco na estante
no livro, nas cruzadas do jornal
no ruído chamusco da novela.

Mãe! Sou mãe

só me sinto de mim e dela
quando ofereço o peito dorido
o braço cansado, o arremesso
de carinho no rodado do berço;
exausto carrocel de sossego.

Meço a almofada bébé do pulso
nas argolas do meu medo
e dentro do sorriso guardo
as dores abertas, os pontos corridos
o assomo claro de estrias
no óleo de amêndoas doces
natas de "Aloe Veras"
falsas de ser milagre.

Faz-me falta a presença do teu ombro
o prometido colo
outro colo de consolo
enquanto fecho os olhos
no descanso da menina

Mãe

faz-me falta a tua mão
um círculo de fogo junto à minha
perto dela. Vem

Vem
embala a Cinderela
a Boa Esperança
- não posso perder ninguém
enquanto dormem os ninhos
na alma de uma criança!

Maria -

O retrato tranversal

Caiu o copo partiu o vidro
a àgua sumiu no ralo aberto
perto da gelosia.
O ovo de casca fina
estalou ficou ao alto
um Colombo sentado
e dentro
o retrato transversal
no livro antigo a preto e branco
uma célula cozida
de Ciência Natural.