terça-feira, 20 de outubro de 2009

Trabalho de casa "Olympia"- texto 2

Eu disse-te meu amor
Ou o gato, ou eu
Alérgica, coçada e nada

Tenho o sofá cheio de pelos
Não me deito nele pelada

A casa é minha
O gato é teu

Sabes que acordei de rabo de gato em nó de gravata?
Nua de gato ao pescoço

Mijo na almofada e nas chinelas!
Mijo no gato e tiro-lhe o rato!

Gato castrado
Ralado?
Papinha de piriláu

A casa é minha
O gato é teu

Tranquei a porta do quarto
E nem tu nem gato

Espreitas à fechadura enquanto me masturbo
Bem feito se de tusa o gato te agarra a blusa

(Ana Janeiro)

Trabalho de casa "Olympia"- texto 1

Recebi as flores, meu amor
Entra no quarto sem bater
E não admires a figura pálida...
Beija os lábios de vermelho

Entra, meu amor
Não receies

E se te parecem mortos os meus olhos, não os feches
Desenha neles o olhar de Olympia

Não vejas o castrado que ali jaz
O sangue seria menos vivo
Imagina a virgem agora mulher
E adorna-me de oiro e uma flor

Teu mais não serei

(Ana Janeiro)
Pois é, apareci como "omarpareceazeite"... perdoem-me a sinédoque!

ana luísa amaral
Minhas caras e meus caros,

Queria dar-vos as boas vindas, infelizmente não com o meu nome, mas com o nome de gestão do blogue – não encontro a minha password, mas, em contrapartida, encontrei endereço e password de gestão do site -- foi a Teresa Almeida Pinto que mo enviou o ano passado, alguns de vós lembrar-se-ão dela.

Não era minha intenção aparecer na qualidade de gestora, nem sei bem como irá isto ficar, quando carregar na tecla “Publicar mensagem”… Veremos. Amanhã peço a um/a de vós, que saiba um pouco mais destes mistérios internéticos do que eu, se me ajuda a “recuperar a identidade” (as aspas têm a ver com a contingência que sempre preside a estes assuntos).

Gostava de dizer-vos como gostei das duas sessões que tivemos já e deixar-vos aqui, como comentário geral ao TPC (o do poema a partir da notícia de jornal), um poema de Adrienne Rich. Fica então original e tradução. Penso que se adequa aos nossos propósitos. Quero ainda deixar os parabéns a todas e a(os dois) todos.

Um abraço – e, creiam, é um prazer estar convosco.

ana luísa



Power (Adrienne Rich, 1974)

Living in the earth-deposits of our history

Today a backhoe divulged out of a crumbling flank of earth
one bottle amber perfect a hundred-year-old
cure for fever or melancholy a tonic
for living on this earth in the winters of this climate

Today I was reading about Marie Curie:
she must have known she suffered from radiation sickness
her body bombarded for years by the element
she had purified
It seems she denied to the end
the source of the cataracts on her eyes
the cracked and suppurating skin of her finger-ends
till she could no longer hold a test-tube or a pencil

She died a famous woman denying
her wounds
denying
her wounds came from the same source as her power


Poder

Viver nos sedimentos da nossa história

Hoje uma escavadora divulgou num flanco de terra em derrocada
uma garrafa âmbar perfeita com cem anos
cura para a febre ou melancolia um tónico
para viver nesta terra nos Invernos deste clima

Hoje eu estava a ler sobre Marie Curie:
ela deve ter sabido que sofria do mal das radiações
o corpo bombardeado anos a fio pelo elemento
que purificara
Parece que negou até ao fim
a origem das cataratas nos seus olhos
a pele da ponta dos dedos gretada e supurante
até já não conseguir segurar um tubo de ensaio ou um lápis

Morreu mulher famosa negando
as suas feridas
negando
as suas feridas vindas da mesma fonte que o seu poder

lembro-me bem




lembro-me bem de ti no hotel de paris.
a avenida larga repleta de almas
as doces palavras, as mãos dadas
o casaco apertado, a cor do frio
no fumo branco do cigarro.

a japonesa de ar pequeno
a boina, o cabelo negro, o laço magro
os lábios excessivos de um rouge lascivo
os laivos de perfume que subiam.
reparaste no olhar, na mão segura
as calças de pirata sem navio
as sabrinas e disseste
"não é vénus de urbino mas olympia"
e rias, rias e rimos ao entrar na pizzaria.
o tinto "rufino" os copos de pé alto
e riamos, riamos.

"marlboro" a marca de um couro duro
no quarto, descomposto abandonado sem corpo
no reflexo do espelho no qual nos revejo.

sem fumo o telhado cinza, lousa sem giz
e tantas, tantas frases soltas que pousavam
e subiam sem raiz, livres e céleres
nos ecos de paris.
lembro-me bem de ti

e dela na avenida
a atitude longa da limousine
alguém de fama;
a sombra da boina, a luva branca
a última sabrina. a pergunta
o navio -

lembro-me bem de ti e dela naquele dia -