terça-feira, 5 de janeiro de 2010

Distância de Oceano




Quando observo as ondas do mar
sinto-te perto.
A distância de Oceano torna-se pequena.
Aquela gaivota sobre a rocha no andar alto
será que andou de cacilheiro?
Viria esta tarde, a esta hora. Disse-te.
Repetimos de Norte a Sul
o paralelismo dos rios
o paralelismo do olhar
e o moleskine no bolso lateral.
De Norte a Sul
o testemunho de palavras, de sentir
que segue a praia, as encostas do mar.
Se na rosa-dos-ventos
cada um procurasse o centro
a trezentos quilómetros de distância
cruzar-se-iam na velocidade da luz
as quatro pupilas de infinita paciência.

Nas tuas letras fico por vezes preocupado.
Porque te encantam os pássaros de asas negras?
Porque colocas nos lábios as espadas, as cabeças cortadas
e esses estranhos lugares onde voam mortes?
Dizes medo? Dizes medo de não ser?
Medo de não ser alegre? Medo de não ser alegre o dia?
Os dias? Faremos alegres os dias.

Sinto nas linhas de comboio a passsagem nas salinas.
O mesmo céu de permeio. Sinto-te. Sinto-te nas brisas.

A metamorfose é um desejo. A possibilidade de ser pequeno,
de ter penas castanhas e o voo confuso dos pardais
no balanço dos ramos, na folhagem da amoreira,
no castanheiro do largo da aldeia.
Foi ali de férias grandes que tudo começou.
A aldeia. Os sinos da igreja. O trinado das badaladas:
É fogo! Foi o pastor! Para o lado das montanhas!

Trinta anos e agora essa distância.
A distância dos romances, dos livros de poesia.
As miragens, os projectos e esses caminhos
que tornámos insurrectos.
Querias ser médica. Quem diria.
Eu. Eu queria outros caminhos.
A lua, as asas de tocar as outras mentes.


E agora a distância. A distância de Oceano
e a impressão de que sempre que junto tábuas
algo falta,
algo falta na construção da jangada -