sexta-feira, 24 de dezembro de 2010
Morte em Veneza
Que rara realeza nos possuía, no exacto momento em que atravessávamos a Piazza San Marco, indecifravelmente e a pé, na inexplicável folia de quem detém e ostenta o edema da essência na precocidade dos caminhos, numa cidade coberta de arte extraterrestre, ao fim e ao cabo fotografias de espelhos e labirintos (não necessariamente por esta ordem e ritmo, causa ou consequência), recessos onde uma fonte nos falava alto e abertamente do tempo inadquirido, como só uma ferida aberta na consciência pudesse esse perfume obter?
Entrávamos assim na História Imaterial de Veneza (HIV positivo), na proporção de fantasmas de gesso e atavios, para provar dessa inaquisição total, dessa pobreza veloz e autêntica que é ser patético, com o ar de quem está a ser, de facto, muito feliz.
“Olha, mamã, são seres do planeta Prestígio!”, pudemos ouvir entre as arcadas uma criança dizer. Mais tarde, abordou-nos um casal apaixonado que queria que lhe lêssemos o destino. Mais tarde ainda, a chuva perspicaz no modo como negociava com as transparências na face do teu sigilo, uma vez arrombado o arcanjo e violado a impostura da cosmética correlativa, exposto o teu púbis aos Verões insociáveis do meu féretro.
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