segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Quatro quadras

Inventário


De que sedas se fizeram os teus dedos,
De que marfim as tuas coxas lisas,
De que alturas chegou ao teu andar
A graça de camurça com que pisas.

De que amoras maduras se espremeu
O gosto acidulado do teu seio,
De que Índias o bambu da tua cinta,
O oiro dos teus olhos, donde veio.

A que balanço de ondas vais buscar
A linha serpentina dos quadris,
Onde nasce a frescura dessa fonte
Que sai da tua boca quando ris.

De que bosques marinhos se soltou
A folha de coral das tuas portas,
Que perfume te anuncia quando vens
Cercar-me de desejo a horas mortas.


José Saramago

Retirado do livro oferta do Jornal de Letras

Poesia curta

Alguns poetas têm o condão de escrever em poucos versos grandes mensagens
daquelas que ficam na memória como uma estrofe de pauta, uma canção.


A história da moral


Você tem-me cavalgado,
seu safado!

Você tem-me cavalgado,
mas nem por isso me pôs
a pensar como você.

Que uma coisa pensa o cavalo;
outra quem está a montá-lo!

Alexandre O'Neill