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Robert Doisneau
de que forma se pode lançar uma semente
para que cresça, sem a intempérie do tempo?
pelo amanhecer longínquo colhi um ramo de pinheiro
manso, de pequenas agulhas, verdes de um rosto
brancas no outro. O aroma era imenso
não doce nem sidra de acidulada fruta
mas uma permanência suave de uma floresta
distante e escondida.
pelo amanhecer longínquo colhi um ramo de eucalipto
não o de folhas compridas e largas fazendo lembrar espadas
mas um outro, de redondas e pequenas, simples círculos.
também o aroma era pleno, mais ácido e penetrante;
os pulmões frescos subiam a âncora, desciam o rio
na impulsão inquestionável do perigo, a rugosidade
áspera no leito liso, tão difícil de descobrir.
pelo amanhecer longínquo, julgo que foi em Abril
subi a encosta íngreme para encontrar a proximidade do azul
o lugar para lá das nuvens onde dormiam as palavras aves
lançadas ainda mal acordadas sobre o abismo
onde o ar era muito
e sendo assim, talvez abrindo as asas
no inato, nos genes adquiridos, sobreviventes
vivas como os cronómetros infinitos.
pelo amanhecer longínquo acordei numa praia
como um sonho inacabado, de chinelos e pijama às riscas
lembrando tudo, o pinheiro manso, as folhas de eucalipto
o barco deslizante, a montanha
as palavras aves sobrevoando indefinidas -
e um mar, um mar na sua constância de sal
qual mistura ácida na substância alcalina
perguntando sempre, à leveza das ondas
à sua dimensão mais branca, de que forma?
de que forma se pode lançar uma semente
para que cresça, sem a intempérie do tempo?