segunda-feira, 22 de março de 2010

Crónica de um W.C. ocupado, por motivos de força maior




Como um copo de vinho pousado na oscilação
o planeta acusa algum cansaço e o meu corpo dança
a ardente contemporaneidade da sua dor.
Tornado morto pela opacidade do instante
eu sou aquele que te espera despejada
de adornos e circunstâncias
do lado de lá da porta da casa de banho
de um comboio com destino ao desencontro.

Ainda demora muito
o amor?

É inútil entregar-me à especulação,
enquanto sofro:
do outro lado, fazes apenas o que todas fazem,
mas muito melhor.
Organizas a minha aflição ao pormenor,
de forma a que não fique nem um minuto de fora
da antiguidade das tuas práticas castigadoras.

Tens o cuidado de morder o lábio inferior quando
por fim o alívio inunda o poema concreto do teu esforço
estrelas que caíram mortas no fundo de um poço
cheio de noite, papel queimado e águas ferozes.

E quando de facto eu não puder mais aguentar
e pensar finalmente em arrombar a porta
o comboio parará na ultima estação do abandono.