quarta-feira, 18 de agosto de 2010
as asas de um aeroplano
Paul Klee "lugar de encontro" 1932
estou insuportável meu amor neste refúgio de silêncio
desço no crepúsculo de Agosto a rua inclinada
que leva ao mar.
aqui e ali alguém sem ruído.
a brisa suave treme e imana morna
breve volta.
na sequência de um instante coloco mentalmente
uma estrada de tijolos que leva além de um arco-íris.
contrariamente ao vulgar, o improvável desconhecido
- um rosto plano, um vestido branco
uma pequena cesta pendente oscila na descida;
malmequeres, dedos de fetos, bagos de mirtilos.
estou insuportável meu amor na inquietude de uma ausência
agora penso nas linhas de um carro eléctrico
amarelo, eléctrico amarelo que revejo
metálico e ronceiro, lentamente
não soa a campainha, no fim, no término
de um cordão de pele
sem condutor nem paragem, a paisagem
desfocada e difusa.
estou insuportável meu amor
corro, agora corro
fecho a porta com estrondo.
no jardim crescem heras
escondem as rugas das pedras
do outro lado a glicínia
agora esparsa de flores violetas
daqui a um mês as amêndoas
daqui a oito o aroma doce doce doce.
estou insuportável meu amor
instável e inseguro, que tolo
de braços á volta da figueira como um aeroplano.
já é tarde
no plátano um pio de coruja aproxima a noite
o sino bate doze badaladas
e a lua crescente permanece naquele canto
a iluminar o vidro antes de adormecer .
estou insuportável, insuportável meu amor
mas a sombra de uma estrela abraça-me a testa
e as arestas em vez de duras e pontiagudas
são de veludo
e uma voz embala-me os ouvidos
ondas, ondas, ondas , o som dos búzios.
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