quinta-feira, 4 de junho de 2009

O piano a preto e branco

Aquele desenho de caracois rolados
onde se compreendia um rosto vago
coloquei-o no sofá vermelho
junto ao candeeiro.
Complexo na técnica singular
imprimia o facto de uma presença ténue
ou talvez uma ausência em fuga de concreto.

A preto e branco
na folha de um qualquer bloco
enquanto ouvia o piano
os dedos nele numa dança
nas teclas deitadas de passagem
rápidas ou lentas
emotivas
e a espaços
em pausas na melodia.

Música plena sem nome
na distância apenas sombras tremidas
de minimas, semínimas, colcheias
e um cálice de Porto na luz da lareira.

Um toque invisível no canto do ombro
o desvio do olhar (extremos da mente)
nos quadrados nocturnos de uma janela;
supuz as estrelas de modo diferente
nascentes de cabelos que desciam cadentes
numa tal mistura de ondas e curvas
que mal se distinguiam as estrelas
dos cabelos e o contorno claro
-lado absorto da redonda lua.

Na folha flectida do desenho único
supuz a vida sem sono estendida
no eco duplo dos passos
batidas certas de ritmos
nos silêncios dos passeios.

Pensei de um outro modo
a troca do direito das coisas
um outro rumo
na imagem de um mar de vagas
transformadas
num mar de espumas.

Sorriste de rosto nítido
aos caracóis de cabelo
no desenho de improviso
era de dia;
e compreendi
junto ao candeeiro
o poder das sombras nos lábios
não como ausência de luz
como acalmia
refúgio
no tempero dos sentidos.

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