sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Devolve-me os dedos

-----------------------------------------A medo vivo, a medo escrevo e falo
-----------------------------------------António Ferreira (1528-1569)




Devolve-me os dedos
que ficaram dormentes
nas fendas da lua

quando as ruas derretiam
e o vento vermelho voava
deixando as pessoas nuas

quando a vertigem trepava
e a virgem voraz rasgava
a garganta que a habitava

Devolve-me o linho branco
que cobria os meus pruridos
curvas e contra costas

quando o aço do teu espaço
se sumia em arrepio
ao cheiro do meu grito

quando os olhos se apertavam
e visões de videntes vinham
em inventadas ausências

Devolve-me o certo de mim
as linhas que me desenham
um ventre que se sustente

e medos que me sobrem
ou ancas que não se dobrem
leva-os no mar para longe

onde não possam dançar
falar ou viver
no instante em que tudo -

1 comentário:

josé ferreira disse...

Gostei de rever este poema que escreveste e leste na sessão. De novo recordei "quando as ruas derretiam/o vento vermelho voava " a seguir"...trepava...voava..habitava"..."as linhas que me desenham/um ventre que me sustente".
Forte e suspenso.
Parabéns!