sábado, 22 de dezembro de 2012

Um poema de Natal por José Almeida Silva


   Imagem daqui

Neste Natal é imenso o frio

Neste Natal é imenso o frio –
Belém é um denso nevoeiro
E um obscuro e tímido silêncio
E o orçamento das famílias
Não suporta o calor

Da mensagem de amor
Que em Belém de Judá
Foi anunciada
Faz tanto tempo já.

O frio então era natural
Tão diferente do frio
Cúmplice e artificial
Dos pastores e reis magos
Destes tempos –

O Menino continua o mesmo
Mas os carneiros e as ovelhas
Estão gordos com as pastagens
Dos outros, já tão magros.

Há de crescer o Menino,
Assim o creio,
E na mão um chicote
Para afastar a tirania
E devolver a Esperança.

Não é da cabeça a sua essência,
O Natal é do coração –
Simplicidade e fraternidade
Não cabem no prodígio frio da razão – 
                                                 
19.12.2012
José Almeida da Silva

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012



2avioes2004Círculos imperfeitos

Pensava ser a conta-gotas, não chegavam claros dias a descoberto, nem teve de ser para sempre

Quebradados
e mais


Quebrados laços
e mais

Quebrados laços imaginados
e mais

eu permaneço

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

os meus gatos não estão aqui


                                        imagem da web

os meus gatos não estão aqui
não miam nos meus ouvidos
não me roçam as pernas
e seria impossível
os ruídos do café são uma fronteira intransponível
os meus gatos não estão aqui –

portanto quando o nevoeiro se expande branco
e cobre a rua com mil gotas invisíveis
os meus gatos não estão aqui –

e estão sempre
com o seu pêlo branco, cinzento ou preto
trazendo nesta distância de luz todas as cores dentro –

os meus gatos não estão aqui
não sobem os móveis para atingir a altura das mãos
não se aninham no colo para ronronarem canções
não fecham os olhos nos seus sonhos de prados
nos seus sonhos adormecidos de rodarem os olhos e esticarem as patas –

os meus gatos não estão aqui
não fazem asneiras para que me lembrem que existem
e que sentem
os afectos das mãos, o aconchego do colo ou a cobertura das lãs –

e estão sempre
de olhos azuis ou castanhos como lampiões na noite escura
como sombras protectoras, como anjos nas manhãs brancas –


josé ferreira 13 dezembro 2012

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

escrevo-te (IV) - a importância da luz


                                imagem daqui

escrevo-te no frio flagrante de uma manhã de inverno
apesar de ser o princípio de dezembro
quando as árvores ainda deixam cair folhas e se tornam transparentes –

escrevo-te com as minhas mãos abertas e na nudez dos ramos
para te dizer que a luz é importante
que as cidades podem ser todos os dias
os cabelos dos sonhos e um mar infinito
ou montanhas brancas 
ou lagos luzidios –

josé ferreira

domingo, 9 de dezembro de 2012

escrevo-te (III) - 366 pedaços de céu



                       imagem em http://expresso.sapo.pt/366-pedacos-de-ceu=f737374

escrevo-te na sensibilidade nas palavras
não encontro melhor forma de dizer
ficamos sempre aquém do que nos sobe na cabeça
em 366 pedaços de céu

ficamos sempre aquém
aquém do amor que dizemos em plumas que sobrevoam
que se imobilizam como se um cisne voasse, pousasse  e falasse
e do seu bico saíssem palavras
palavras escritas em pequenos círculos no espelho de um lago –

ficamos sempre aquém da pele que nos abraça
quando os dedos se tocam e há um homem
e há uma mulher  –

escrevo-te sabendo da fronteira e dos limites
das portas e das janelas
dos quiosques, das escolas, dos escritórios e dos cafés;
aquelas mesas cheias de olhos –

e das bibliotecas
da imensidão das prateleiras, paralelas
na longitude das folhas
na curvatura dos livros onde se deitam as histórias –

sei bem dos limites e das asas que não voam
e no entanto, vejo-te  e escrevo  
e dou-te a mão sem pressa
em 366 pedaços de céu


 josé ferreira 9 dezembro 2012

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

A Secreta Viagem


                                                imagem daqui

No barco sem ninguém, anónimo e vazio,
ficámos nós os dois, parados, de mão dada...
Como podem só dois governar um navio?
Melhor é desistir e não fazermos nada!

Sem um gesto sequer, de súbito esculpidos,
tornamo-nos reais, e de madeira, à proa...
Que figuras de lenda! Olhos vagos, perdidos...
Por entre nossas mãos, o verde mar se escoa...

Aparentes senhores de um barco abandonado,
nós olhamos, sem ver, a longínqua miragem...
Aonde iremos ter? — Com frutos e pecado,
se justifica, enflora, a secreta viagem!

Agora sei que és tu quem me fora indicada.
O resto passa, passa... alheio aos meus sentidos.
Desfeitos num rochedo ou salvos na enseada,
a eternidade é nossa, em madeira esculpidos!

David Mourão-Ferreira in A Secreta Viagem

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

duas almas


                                   Imagem retirada da web

um voo de espírito e um pousar pesado
assim com as duas mãos e os dois pés
mão a mão e passo a passo
à vez e sob o sol que acompanha o espaço
entre laranjas
escondidas nas árvores

almas unidas que ninguém separa –

josé ferreira 4 dezembro 2012

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

escrevo-te (II) - Lou e Rilke, um espelho de almas




caíram muitas folhas e o chão crepita nos nossos passos 
uma fogueira acesa sem chamas de lareira
enquanto
uma coluna de fumo e as  chamas dentro, internamente
no interior da cabana onde Lou e Rilke uniram os dedos
onde ela lhe alisava os cabelos e ele escrevia versos
intensos, versos intensos
versos sobreviventes e cartas que prosseguiram
para além de muitos anos –

o vento da minha cidade atravessou a Europa
desceu a serra e vem juntos das faces.
como um rio de ar cheio de ruídos
poliniza as letras em palavras
alimenta-se de folhas em branco –

como um vício, o bom vício dos afectos
que estende as mãos na pele das magnólias e as admira brancas
brancas
muito brancas e oscilantes
em pétalas de pálpebras
janelas que se abrem 
um espelho de almas –

josé ferreira 2 de dezembro de 2012

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Ode à Mentira





Crueldades, prisões, perseguições, injustiças,
como sereis cruéis, como sereis injustas?
Quem torturais, quem perseguis,
quem esmagais vilmente em ferros que inventais,
apenas sendo vosso gemeria as dores
que ansiosamente ao vosso medo lembram
e ao vosso coração cardíaco constrangem.
Quem de vós morre, quem de por vós a vida
lhe vai sendo sugada a cada canto
dos gestos e palavras, nas esquinas
das ruas e dos montes e dos mares
da terra que marcais, matriculais, comprais,
vendeis, hipotecais, regais a sangue,
esses e os outros, que, de olhar à escuta
e de sorriso amargurado à beira de saber-vos,
vos contemplam como coisas óbvias,
fatais a vós que não a quem matais,
esses e os outros todos... - como sereis cruéis,
como sereis injustas, como sereis tão falsas?
Ferocidade, falsidade, injúria
são tudo quanto tendes, porque ainda é nosso
o coração que apavorado em vós soluça
a raiva ansiosa de esmagar as pedras
dessa encosta abrupta que desceis.
Ao fundo, a vida vos espera. Descereis ao fundo.
Hoje, amanhã, há séculos, daqui a séculos?
Descereis, descereis sempre, descereis.

Jorge de Sena, in 'Pedra Filosofal'

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

escrevo-te

                                        imagem daqui

escrevo-te directamente no princípio da noite
não como amigo mas como amante
desconhecendo-te o corpo, pensando-o pelo voo
pela asa que se ergue e pousa
naquela árvore junto da janela
um braço castanho, um braço de seiva
um braço de penas
leve como a brisa em tardes imaginadas -

escrevo-te no intervalo do sono de olhos iluminados
e tantas são as cores
luzem -

canso-te de palavras, bem sei, e falo-te por metáforas
campainhas que podem ser flores
margaridas, bem-me-queres, jacintos flutuantes em frascos -

até que despertes
até que afastes o lençol bordado
até que surja a primeira torrada
até que a luz seja autêntica e muito clara
até que segures o cabelo depois de entrares no carro -

josé ferreira 23 novembro 2012





quinta-feira, 22 de novembro de 2012


 MÁRCIA MAROSTEGA - AMIZADE  

"A gente não faz amigos, reconhece-os."

Vinícius de Moraes

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Por

Terra vista do Céu 1 - Yann Arthus-Bertrand
Coração de Voh em 1990, Nova Caledônia, França (20°56’ S – 164°39’ L)

Por não saber como dizer-me O Que É Que Foi?
tão perto, e frisada, seja

única a metáfora sobre o Amor

a haver instante sem quase

levantar-se-ão dias, Completos

Anabela  brasinha

domingo, 18 de novembro de 2012

Se adianta

 


Como folha a cair me falas, a seguir há geada, depois a queimadura, que não sabes nada de primavera.
E sim, voltas, mas falta sempre essa estação. Correu a água, foram, as chuvas, os ventos, que são paralelos a ti, e é na sombra que detesto te dar a mão, que aliás, nem queres, só que não posso te ver no chão.
Já nem sei se é o melhor, se adianta, já nem penso, seja o que for, se deus existisse, fosse como deus quisesse.


                                                      Anabela Couto Brasinha



Conto-te

Paris Torre Eiffel fim de tarde, fotógrafo Luis Prado, São Paulo
Paris, Torre Eiffel, fim de tarde, fotógrafo Luis Prado (São Paulo)

 
  Desci a rua ao fim da tarde para ver aquelas cores, esse azul e laranja matizado, e desejei encontrar-te nas ruas da baixa.
Quando passei na rua onde estava a sala de jantar, onde também tinha estado acompanhada, temi que aparecesses. É que nessa sala tinha-se enchido o som do piano, e do outro lado da mesa foi repetido, Se quisesses vias como esperam que o teu olhar pouse sobre eles. Muito mais tarde pensei, então era isso, capricho! Chorei, e lembrei que se calhar, só mesmo o pianista teria percebido a pontinha de tristeza e a minha ilusão de pensar que me iria despedir dela.
Voltei a passar no largo da lapa, para ir visitar uma mulher. Estava frio nessa noite, também estava frio enquanto subia a escada a meia-luz. E quando entrámos na sala, essa mais iluminada, é que vi, metade do seu rosto e pescoço, e o meu olhar foi pousar na sua mão, com a pele também enrugada pelas queimaduras. Chorei compulsivamente, ela abraçou-me. Quando nos sentámos na mesa redonda, já com as duas chávenas de chá, perguntei-lhe quando soube. Ela disse, Ainda faltavam uns dias para voltar ao Porto quando me disse que eu queria partir, que tinham sido os seus dias mais felizes mas que eu queria partir, percebi que para ele eu não era... Terminei-lhe a frase, e ela recomeçou a falar, Não me lembro bem da viagem de regresso, nem de chegar a casa. Só me lembro de acordar no hospital. Tive algumas visitas, foi muito constrangedor para elas, não perguntavam... Disse-lhe, Pois, pensaram que querias morrer. Devagar ela esboçou um sorriso para dizer-me, A coragem só existe quando temos medo, e não temo a morte... Mas… lamento ter agido de impulso, só quando voltei a casa e me despi em frente ao espelho... Levantei-me da cadeira, contornei a mesa para a abraçar. Depois ela disse-me, Tens de ser... Sorri-lhe a confirmar.

(2010-2011)

                                                                           Anabela Couto Brasinha

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

É com o coração abelhudamente alegre que vos convido a virem partilhar comigo o voo inaugural da Abelha Zarelha e a tarde de dia 24 de Novembro.
Gostava muito que pudessem estar presentes... Zuuummm.
 
 
Um abraço,
Raquel Patriarca