quarta-feira, 5 de agosto de 2009

A forma justa


(Fotografia retirada da Internet)



Sei que seria possível construir o mundo justo
As cidades poderiam ser claras e lavadas
Pelo canto dos espaços e das fontes
O céu o mar e a terra estão prontos
A saciar a nossa fome do terrestre
A terra onde estamos — se ninguém atraiçoasse — proporia
Cada dia a cada um a liberdade e o reino
— Na concha na flor no homem e no fruto
Se nada adoecer a própria forma é justa
E no todo se integra como palavra em verso
Sei que seria possível construir a forma justa
De uma cidade humana que fosse
Fiel à perfeição do universo

Por isso recomeço sem cessar a partir da página em branco
E este é meu ofício de poeta para a reconstrução do mundo

Sophia de Mello Breyner Andresen, in "O Nome das Coisas"

1 comentário:

António Pinto de Oliveira (António Luíz) disse...

É um poema lindo, que transmite uma louca esperança, o acreditar no impossível. Será assim? É dificil aceitar que assim tenha que ser! Mas se eu pensar que não há sequer uma "Cidade humana" na totalidade , mas apenas algum humanismo em eventuais parcelas ou sectores específicos da mesma, -como aliás a perfeição do Universo tantas vezes derrapa em episódios de selvajaria e eventos de mortandade para o ser humano -, então sim eu aceito a beleza sonhadora do poema, mas associadamente a grande utopia (ou hipocrisia ?) da poesia...Mas não nos fica mal de quando em vez "abanar, ou profanar" a nossa sensibilidade humanística quando carregada de algum onirismo... Aqui fica também toda a minha admiração por esta magnífica Poetisa.