sexta-feira, 27 de novembro de 2009

a carta rodeada de nomes


René Magritte "A corda sensível" 1960

Pensei em guardá-los dentro de uma carta
- os pensamentos, os versos
quando caem na primeira página
um nascer de águas nos ritmos brancos de flúor
seguidos de gavetas indecisas na cor de camisas
nas calças justas ou de vincos; não se usam já
bocas de sino presas nos joelhos largas no fundo.
guardá-los na primeira prateleira
de olhar distante enquanto aqueço o leite
ou meço a consistência da manteiga
no pão fresco ainda estaladiço.
alguém me fala do tempo: “parou a chuva
ficou o vento, os primeiros frios”
não compreendo no receio de perdê-los
- os versos, os pensamentos.
assim escondidos em pequenos gestos
são segredos e sei-os de serem ternos
de estar comigo como folhas de fetos
ainda verdes, a crescerem e serem filhos.
plenos de sentimento são companhia
bater de dedos no tampo da mesa
contar degraus um a um de granitos
saber quantos os pássaros na longitude dos postes
no correr dos fios ou estudar as nuvens
as suas formas e feitios, vagas de espumas
mousse de cortinas no vagar da velocidade
esticar de rede que descobre o lugar do céu
imaginário, etéreo.

o medo de os perder – os versos, os pensamentos
não os tornar a ver, não mais conversar com eles
tirá-los da testa, alisar-lhe os cabelos.
por isso pensei que é melhor guardá-los numa carta
e nessa carta, para que cheguem a casa, pôr um selo
e rodeá-lo de muitos nomes, muita gente dentro deles.

1 comentário:

Unknown disse...

*E na poesia dos outros que vejo o tanto ainda que tenho de "crescer"...
Obrigada