qual o sinal que prenuncia o facto? caiu uma pedra de um muro sobre a estrada era azul e amarela na casa abandonada agora na cor cinzenta,abstracta. na inclinação de luz um vidro inteiro é branco e ninguém já existe por detrás da janela; a ruína de um quadrado, um campo de batalha depois a escola
depois na escola as pedras não falam alto silvam na forma de dedos maiores uma toada por sob uma cruz de cimento e um lamento : mas porquê? e depois o silêncio, sempre, sempre o silêncio
passado muito tempo surge a pergunta: como será o fundo de um rio quando quer o mar? e os peixes?
"com o correr dos anos, observei que a beleza, tal como a felicidade, é frequente. Não se passa um dia em que não estejamos, um instante, no paraíso." Jorge Luís Borges "Os conjurados"
madrugada:o fumo branco de um universo onde o mar tem barcos de bosque e erva raios reflexos de neve e mármores impuros
os corvos voaram sem ruído na lua breve
linha a linha a semente o segredo múltiplo das orquídeas
a derme treme nua cresce uma voz de terra profunda mística como um hino na sombra: acredito em ti mulher em ti...em ti...em ti...
A imagem lendária de uma mulher descalça não porque as mãos estejam sempre descalças mas porque os pés são as mãos das nossas desinibições. A cidade não está preparada para a leveza que uma mulher desempenha descalça e oferece a sua espada à doença simpática do amor.
Só os pobres e os pássaros e as ambulâncias a vêem passar porque nunca cicatrizam onde a necessidade vende melhor. Na perspectiva da cidade dos homens uma mulher descalça põe a morte em perigo e a vida depois.
Os homens ignoram, pelo menos três vezes por dia, esta erótica crepuscular. E vão para o Café e discutem gases política póstuma e cerveja com futebol.
Se eu definisse o tempo como um rio, a comparação levar-me-ia a tirar-te de dentro da sua água, e a inventar-te uma casa. Poria uma escada encostada à parede, e sentar-te-ias num dos seus degraus, lendo o livro da vida. Dir-te-ia: «Não te apresses: também a água deste rio é vagarosa, como o tempo que os teus dedos suspendem, antes de virar cada página.» Passam as nuvens no céu; nascem e morrem as flores do campo; partem e regressam as aves; e tu lês o livro, como se o tempo tivesse parado, e o rio não corresse pelos teus olhos
quanto ao tempo um pouco mais louro e quente o adeus do inverno no caule esguio dos junquilhos. amarelo o sorriso quanto à política. dizem que PECados ninguém tem; história antiga de Cerejeira que não usava brincos.
empurra para o lado tapa o bocejo da confirmação um pouco cinza na extinta Assembleia de credos "Pap'açorda"
o senhor presidente silêncio. serenidade. filosofia. Sócrates sempre soube, mas era o outro. o gato tem sete vidas, "Free" as the wind. TeVI à escuta do jornalista.
o senhor presidente ar circunspecto de economista. ainda não é hora de bomba atómica (talvez para o ano, quem sabe no meio do terreiro do paço; um cogumelo mágico. depois lava-se tudo no Tejo e daqui a mil anos volta o ùltimo dos moicanos)
quanto ao governo, procurador, casa pia liberdade,censura - opinião nemhuma.
humildemente na consciência da história erros erros inscritos como raios o paradigma de uma tempestade de silêncios.
flua o rio, a seiva,a mãe árvore o incenso da verdade que derrube as montras gastas de palavras apertadas que derrame o néctar de um fio de horizonte; um anel de fumo branco do fundo da terra;
a essência de mãos e dedos como escudo das espadas dos desertos e das sombras -
às dezoito e trinta de um dia de domingo uma a uma as folhas de eucalipto o seu sentido e um aroma intenso, opulento de natura; liberto fumo de uma lei pura às dezoito e trinta. domingo.
folhas de eucalipto ferventes, nebulosas, sobrenadam dentro de um lago de oriente resultam fumo gotas condensadas lâmpadas de imagens de Aladino voadoras, como danças indescritas extremos quadros, alegorias e uma tontura às dezoito e trinta -
acordes de gitanos, harpejos, harpejos e uma nota de piano lânguida, suspensa - um desejo de domingo.
Minha cabeça estremece com todo o esquecimento. Eu procuro dizer como tudo é outra coisa. Falo, penso. Sonho sobre os tremendos ossos dos pés. É sempre outra coisa, uma só coisa coberta de nomes. E a morte passa de boca em boca com a leve saliva, com o terror que há sempre no fundo informulado de uma vida. Sei que os campos imaginam as suas próprias rosas. As pessoas imaginam os seus próprios campos de rosas. E às vezes estou na frente dos campos como se morresse; outras, como se agora somente eu pudesse acordar. Por vezes tudo se ilumina. Por vezes sangra e canta. Eu digo que ninguém se perdoa no tempo. Que a loucura tem espinhos como uma garganta. Eu digo: roda ao longe o outono, e o que é o outono? As pálpebras batem contra o grande dia masculino do pensamento. Deito coisas vivas e mortas no espírito da obra. Minha vida extasia-se como uma câmara de tochas. - Era uma casa – como direi? – absoluta. Eu jogo, eu juro. Era uma casinfância. Sei como era uma casa louca. Eu metia as mãos na água: adormecia, relembrava. Os espelhos rachavam-se contra a nossa mocidade. Apalpo agora o girar das brutais, líricas rodas da vida. Há no esquecimento, ou na lembrança total das coisas, uma rosa como uma alta cabeça, um peixe como um movimento rápido e severo. Uma rosapeixe dentro da minha ideia desvairada. Há copos, garfos inebriados dentro de mim. - Porque o amor das coisas no seu tempo futuro é terrivelmente profundo, é suave, devastador. As cadeiras ardiam nos lugares. Minhas irmãs habitavam ao cimo do movimento como seres pasmados. Às vezes riam alto. Teciam-se em seu escuro terrífico. A menstruação sonhava podre dentro delas, à boca da noite. Cantava muito baixo. Parecia fluir. Rodear as mesas, as penumbras fulminadas. Chovia nas noites terrestres. Eu quero gritar paralém da loucura terrestre. — Era húmido, destilado, inspirado. Havia rigor. Oh, exemplo extremo. Havia uma essência de oficina. Uma matéria sensacional no segredo das fruteiras, com as suas maçãs centrípetas e as uvas pendidas sobre a maturidade. Havia a magnólia quente de um gato. Gato que entrava pelas mãos, ou magnólia que saía da mão para o rosto da mãe sombriamente pura. Ah, mãe louca à volta, sentadamente completa. As mãos tocavam por cima do ardor a carne como um pedaço extasiado. Era uma casabsoluta – como direi? - um sentimento onde algumas pessoas morreriam. Demência para sorrir elevadamente. Ter amoras, folhas verdes, espinhos com pequena treva por todos os cantos. Nome no espírito como uma rosapeixe. - Prefiro enlouquecer nos corredores arqueados agora nas palavras. Prefiro cantar nas varandas interiores. Porque havia escadas e mulheres que paravam minadas de inteligência. O corpo sem rosáceas, a linguagem para amar e ruminar. O leite cantante. Eu agora mergulho e ascendo como um copo. Trago para cima essa imagem de água interna. - Caneta do poema dissolvida no sentido primacial do poema. Ou o poema subindo pela caneta, atravessando seu próprio impulso, poema regressando. Tudo se levanta como um cravo, uma faca levantada. Tudo morre o seu nome noutro nome. Poema não saindo do poder da loucura. Poema como base inconcreta de criação. Ah, pensar com delicadeza, imaginar com ferocidade. Porque eu sou uma vida com furibunda melancolia, com furibunda concepção. Com alguma ironia furibunda. Sou uma devastação inteligente. Com malmequeres fabulosos. Ouro por cima. A madrugada ou a noite triste tocadas em trompete. Sou alguma coisa audível, sensível. Um movimento. Cadeira congeminando-se na bacia, feita o sentar-se. Ou flores bebendo a jarra. O silêncio estrutural das flores. E a mesa por baixo. A sonhar.
Torner "quatro quartetos - quatro estações (a T.S.Eliot))" 1979
como se fosse um intervalo na exortação dos crocodilos
entre dois rios e outras noites um deus de pequenas coisas revela as horas de todos os nomes; um jardim sem limites em busca do tempo perdido; o caminho de Swann.
a faca não corta o fogo de 366 poemas de amor; a luz da sua lucidez passeando sob a brisa de uma cidade invisível.
combateremos a sombra de sentimentos à deriva
na outra margem da memória -
josé ferreira
Tradução de um roubo de palavras:
O segredo do Rio - Miguel Sousa Tavares
Se fosse um intervalo – Ana a Luísa Amaral Entre dois rios e outras noites- "
Exortação dos crocodilos – António Lobo Antunes
O Deus das pequenas coisas – Arundhati Roy
As horas – Michael Cunningham
Todos os nomes – José Saramago
O Jardim sem limites – Lídia Jorge
Combateremos a sombra - “
Em busca do tempo perdido – Marcel Proust O caminho de Swann "
A faca não corta o fogo - Herberto Hélder
366 poemas de Amor – Vasco Graça Moura
A lucidez do Amor – Tânia Ganho
Um deus passeando sob a brisa da tarde - Mário de Carvalho