sexta-feira, 20 de abril de 2012

o poema de Villa-Lobos e o meu poema sobre a mesma melodia



Bachianas Brasileiras No. 5
Heitor Villa Lobos

(Letra de poema cantado na ária que poucos conhecem e se torna quase imperceptível pelo som agudo da melodia. No vídeo surgem as palavras no andamento da voz bem como a cópia original da partitura, a data de apresentação, 1939, e a dedicatória a sua mulher de nome Arminda (Mindinha))

Tarde uma nuvem rósea lenta e transparente.
Sobre o espaço, sonhadora e bela!
Surge no infinito a lua docemente,
Enfeitando a tarde, qual meiga donzela
Que se apresta e a linda sonhadoramente,
Em anseios d'alma para ficar bela
Grita ao céu e a terra toda a Natureza!
Cala a passarada aos seus tristes queixumes
E reflete o mar toda a Sua riqueza...
Suave a luz da lua desperta agora
A cruel saudade que ri e chora!
Tarde uma nuvem rósea lenta e transparente
Sobre o espaço, sonhadora e bela!

Ruth Valadares Correa

Bachianas Melodias


José Ferreira

as bachianas melodias penetram o tecto vazio
as amplas raízes, de voz feminina -

as bachianas, de Villa-Lobos, nº 5

desfibrando terminologias
lianas finas, sentidos forasteiros
palpitando o socorro das clareiras
na vasta selva savânica
onde o dia escoa ao som de ruídos
que são mudos na noite das bachianas -

prudente juntar lenhas, pedaços de chama
na luz intermitente que afaste as feras
a fogueira num batimento pré-histórico
de lascas e chuvas de faíscas;
brasas,
uma luz emergente altiva de pirilampos
na luz escura de uma orquestra anómala de grilos;
esses músicos vadios em traje de gala
desconexos e perdidos num mar de arbustos
escondidos e apagados, gris-gris em silêncio,
sem existência
no som mágico de sopranos, os sustenidos, a voz feminina -

as bachianas, de Villa-Lobos, nº 5

sons de dança curvilínea
hipnose oscilante de sorrisos
vestido sem manchas de hienas
quietas, atentas
na clareza aguda das melodias -

as bachianas, de Villa-Lobos, nº 5

demovendo os olhos cansados, cercados de linhas roxas
nos braços nus de uma tempestade interna, soberana e límpida -

as bachianas melodias

o sossego encantado, um regaço de abandono
o busto da harpa dourada
crescendo nas cordas de celos
e de violinos, a voz feminina -

as bachianas, a nº 5, a que te dedico

suspenso nas asas da música
um sonho de iridium e platina, a química
e um voo oblíquo de pássaros
insustentáveis e dirigidos
na mistura azul, o desbravar de infinitos
o reconstruir de tecidos
como lençóis de linho, magoados de tantos anos
de linhas e linhas;
fios débeis, fios gastos, fios finos, fios belos

a voz feminina -

josé ferreira
(um poema revisto, inicialmente escrito em 2009)

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