O poeta quer escrever sobre um pássaro:
e o pássaro foge-lhe do verso.
O poeta quer escrever sobre a maçã:
e a maçã cai-lhe do ramo onde a pousou.
O poeta quer escrever sobre uma flor:
e a flor murcha no jarro da estrofe.
Então, o poeta faz uma gaiola de palavras
para o pássaro não fugir.
Então, o poeta chama pela serpente
para que ela convença Eva a morder a maçã.
Então, o poeta põe água na estrofe
para que a flor não murche.
Mas um pássaro não canta
quando o fecham na gaiola.
A serpente não sai da terra
porque Eva tem medo de serpentes.
E a água que devia manter viva a flor
escorre por entre os versos.
E quando o poeta pousou a caneta,
o pássaro começou a voar,
Eva correu por entre as macieiras
e todas as flores nasceram da terra.
O poeta voltou a pegar na caneta,
escreveu o que tinha visto,
e o poema ficou feito.
Nuno Júdice
In " A matéria do poema"
Publicado por Maria Celeste Carvalho
sábado, 11 de outubro de 2008
Os meninos de Angola
Os meninos de Angola
Já não se sentam à roda
Da fogueira...
Não ouvem histórias
Fantásticas, de encantar...
Nem adormecem
Ao som de velhas canções
De magia e de ninar.
Os meninos, apagada a fogueira,
Nunca conheceram a escola,
Os doces,
O riso
E a brincadeira...
Os meninos de Angola
Conhecem a guerra, a miséria, o sofrimento...
Cheiram a morte, a loucura,
A chacina e o tormento,
De um País martirizado,
Ferido,
Sangrado!
Os meninos de Angola
O olhar baço, distante...vago...
Perdido!
As mãos pequeninas, escuras, geladas...
Fecham-se em concha,
Cheias ... de nada!
Bocas ávidas, vorazes...
Lábios finos, ressequidos
Que sugam a Morte, em seios secos...
Sacos gastos, vazios
Pendidos!
Os meninos de Angola
Já não se sentam à roda
Da fogueira...
Jazem e agonizam, na terra nua
Vermelha,
Encharcada de lágrimas,
De sangue,
De horror...
Esqueletos vivos...
Barrigas redondas...enormes
Grávidas de fome!
Prenhes de dor!
Corações inocentes, tristes, cansados ...
Sufocados de medo...
Transidos de frio...
Sob o sol africano, ardente...
Dardejante...suado...sangrento!
África...calor...raios de luz
Flamejantes!
Riqueza, quanta riqueza...
Fartura, gula só...para alguns!
África desumana...egoísta...gananciosa...
Indiferente!
Angola senhorial,esbanjadora,
Vaidosa!
Rica em minério,
Petróleo e diamantes!
Abundância que os meninos não conhecem...
Que não os alimenta,
Não lhes dá vida,
E não os consola!
Os meninos, perdida a Esperança...
Choram e gemem sozinhos,
Mirrados de fome,
A arder em febre!
E, sem nunca ter sido crianças
Choram baixinho
E desesperam...
Desesperam...!
Os meninos de Angola
Já não se sentam à roda
Da fogueira ...
Vão morrendo devagar,
Devagarinho...
E jazem, famintos, esgotados, doentes
No chão ...
Na pedra ...
Na poeira ...!
Refeição adiada dos abutres ...
Que... medonhos, imóveis, salivam...
Salivam gulosos!
E, pacientes...medonhos...esperam!
Esperam gulosos!
Esperam...
Esperam...
Maria Celeste Carvallho
Já não se sentam à roda
Da fogueira...
Não ouvem histórias
Fantásticas, de encantar...
Nem adormecem
Ao som de velhas canções
De magia e de ninar.
Os meninos, apagada a fogueira,
Nunca conheceram a escola,
Os doces,
O riso
E a brincadeira...
Os meninos de Angola
Conhecem a guerra, a miséria, o sofrimento...
Cheiram a morte, a loucura,
A chacina e o tormento,
De um País martirizado,
Ferido,
Sangrado!
Os meninos de Angola
O olhar baço, distante...vago...
Perdido!
As mãos pequeninas, escuras, geladas...
Fecham-se em concha,
Cheias ... de nada!
Bocas ávidas, vorazes...
Lábios finos, ressequidos
Que sugam a Morte, em seios secos...
Sacos gastos, vazios
Pendidos!
Os meninos de Angola
Já não se sentam à roda
Da fogueira...
Jazem e agonizam, na terra nua
Vermelha,
Encharcada de lágrimas,
De sangue,
De horror...
Esqueletos vivos...
Barrigas redondas...enormes
Grávidas de fome!
Prenhes de dor!
Corações inocentes, tristes, cansados ...
Sufocados de medo...
Transidos de frio...
Sob o sol africano, ardente...
Dardejante...suado...sangrento!
África...calor...raios de luz
Flamejantes!
Riqueza, quanta riqueza...
Fartura, gula só...para alguns!
África desumana...egoísta...gananciosa...
Indiferente!
Angola senhorial,esbanjadora,
Vaidosa!
Rica em minério,
Petróleo e diamantes!
Abundância que os meninos não conhecem...
Que não os alimenta,
Não lhes dá vida,
E não os consola!
Os meninos, perdida a Esperança...
Choram e gemem sozinhos,
Mirrados de fome,
A arder em febre!
E, sem nunca ter sido crianças
Choram baixinho
E desesperam...
Desesperam...!
Os meninos de Angola
Já não se sentam à roda
Da fogueira ...
Vão morrendo devagar,
Devagarinho...
E jazem, famintos, esgotados, doentes
No chão ...
Na pedra ...
Na poeira ...!
Refeição adiada dos abutres ...
Que... medonhos, imóveis, salivam...
Salivam gulosos!
E, pacientes...medonhos...esperam!
Esperam gulosos!
Esperam...
Esperam...
Maria Celeste Carvallho
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