segunda-feira, 11 de abril de 2011

Colhe de um corpo o carvão verde


Felix Revello

Colhe de um corpo

o carvão verde

a sua música cereal moída moída.

Abre um corpo na partitura canta-o

enquanto se parte enquanto ficam

anos por contar enquanto ficam

anjos nas pálpebras

inconfessáveis.

Como se a manhã falhasse sempre.

Como se escolhesses o comboio que pára

em todas as estações

e valesse a pena gastar outra infância

para não chegar.


Catarina Nunes Almeida Revista Cráse

A curva dos Teus olhos


Isabelle Hupert

A curva dos teus olhos dá a volta ao meu peito
É uma dança de roda e de doçura.
Berço nocturno e auréola do tempo,
Se já não sei tudo o que vivi
É que os teus olhos não me viram sempre.

Folhas do dia e musgos do orvalho,
Hastes de brisas, sorrisos de perfume,
Asas de luz cobrindo o mundo inteiro,
Barcos de céu e barcos do mar,
Caçadores dos sons e nascentes das cores.

Perfume esparso de um manancial de auroras
Abandonado sobre a palha dos astros,
Como o dia depende da inocência
O mundo inteiro depende dos teus olhos
E todo o meu sangue corre no teu olhar.

Paul Eluard,"Algumas das Palavras" Trad. de António Ramos Rosa Dom Quixote 1977