quarta-feira, 24 de março de 2010

lago Windermere


vista do lago Windermere (retirado da internet)


o escritor precisava escrever uma história
afastar os fantasmas de uma vaga de silêncio.

de um calendário na parede do quarto, março
saiu a mosca, voou a imagem

...duas horas da tarde nas margens do lago Windermere
e a distância de três árvores que nos separa
de um barco, uma água branca , parada.

o saber antigo de artesão colocou os talheres
em couro de presilhas no cesto de merenda
oferta de Lady Sheena, dama inglesa, amiga.

chegar primeiro. puro egoísmo de estender uma toalha
arrumar os remos, sentir o barco, e do teu lado
colocar o chapéu de palha.

por aquele sorriso faria replay no comando
como um disco de vinil gago no risco de um diamante.
de olhar fixo na página de um tecido indiano, esvoaçante
guardei a fotografia, sensível como o som certo de um piano.

disseste sério. disse deslumbrado
no contraste da cor sépia do cais e o singular colar
três cerejas de cerâmica num fio de prata
e um brinco natural de uma pena de perdiz
como um pêndulo de Freud em espiral.

o gesto seguinte abriu-te os lábios
quando da água do lago baptizei as pálpebras
e agradeci as asas audazes
que me davam os teus braços
caindo segura e suave no barco que balouçava.

não sei a que horas saímos do lago Windermere
mas as nuvens já não eram reflectidas.

na manhã seguinte, junto á água, um céu azul de Veneza.
cinco cisnes de olhos tristes aguardaram as migalhas.
um pássaro de 237 cabeças sobrevoou o aeroporto
subiu acima de uma nuvem cinzenta
no formato de um elmo árabe ...

parou na surpresa de um café amargo.
esquecera a quantidade exacta de hidratos de carbono;
no ambíguo disfarce que quebrou o sonho
fechou os olhos, sentiu a imagem que voava
de volta à parede de um quarto
ao calendário. março -