sexta-feira, 24 de junho de 2011
não queiras acordar as palavras durante o dia
não queiras acordar as palavras durante o dia, dormitam
vê como respiram -
depois a lua abre os olhos e as palavras esticam os braços
vê como espreguiçam -
e juntam-se em células de escrita como um tecido;
depois um corpo e um outro ainda
vê como se alinham -
tornam-se fortes, ao sul, ao norte
e preferem o mar que é vasto, largo, infinito -
vê como ensinam os ecos redondos
e escrevem um caminho
pelos reflexos brancos das ondas
iluminando as sombras negras, as culpas em fatias
esquecendo tudo e voando por cima -
vê como descansam, agora que é de dia
vê como voltam pela noite, suaves e invisíveis
rodeando
os teus olhos de Afrodite, o teu corpo de ninfa
e caindo
na prata das mãos, no ouro das linhas
como chuva de sedas, escorrendo na forma de letras
a cor permanente das tintas
e subindo, de seguida, pelo tronco dos cabelos aos ramos dos ouvidos
soprando o vento azul dos sensíveis, os versos, invisíveis;
uma cortina de lábios
por todos os lados, em uníssono
desfolhando as pétalas dos poros, síncronas e decisivas -
as palavras incompletas são como as malhas de Penélope
os versos, como os trabalhos de Ulisses
quanto ao pêndulo do tempo, não diz quando
mas pelo sal doce das vagas e pelo salto dos golfinhos
anuncia Ítaca -
José Ferreira 23 Junho 2011
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