sábado, 10 de abril de 2010

Antígona


Frederic Leighton "Antígona"

Uma chama áurea de um folheado precioso
No alto de uma coluna antes de subir o pano.
Antígona como um raio ilumina Tebas
Aquece o ambiente e torna pesados e quentes
Casacos compridos numa noite de março.
Ruídos incómodos de rebuçados crepitam
De intensidade, alertam os espíritos.
Antígona desafia uma longa ceia de abutres
A escura lei coberta de labirintos;
A ilusão dos vigias.
Não pode esquecer as sementes dos campos
O irmão morto na porta dos desertos.

Húmus, húmus e o ódio dos homens
As cavernas e as tragédias – sinais gregos
Fumos, fumos brancos de inocentes
Lembrou Aída, Radamés, música de ópera
E uma roda gigante de pedra como tambor
Um fim de requiem, pancada seca.

Regresso, regresso ao distante tempo
De pedras bíblicas e margens do grande rio
Sob o poder do cajado que afoga egípcios
No correr dos crocodilos.
Deus, Deus, porque não existes?

Não há braços sobre Antígona.
Ondula um brinco e um vestido sob a a brisa.
Um risco negro onde antes as pupilas.
As unhas nas sandálias como pétalas de tulipa
E um pêndulo no anel apertado de uma fita.

Antígona, bem, fizeste bem
O respeito do sangue, do parto, da mãe
O incomum de ser alguém.

E Antígona, nada mudou, apenas os séculos
E os males modernos do clima.
A mesma inconsciência; o ódio, o inimigo.

Noite fria e pouco depois o fado
A guitarra, o baixo, a letra repetida.
Nada mudou Antígona, lamento.
Muitos gritos ingénuos, a utopia.

Há seringas de plástico pelos bancos da Batalha
Em frente um reclame luminoso
De um dia mundial de um teatro
Ali ao lado um beco sujo, um vão escuro
E o fingimento de voz macia nos lábios roxos
Na postura de perna gorda e saia mini.
Na porta dos artistas ouro, make up
E cheiros de naftalina, um casaco de peles
Borsalino .
Ali ao lado uma garrafa de vinho tinto
Na voz rouca de estudantes falando outra língua
Em hipotenusa no vértice de um triângulo.

Uma , uma e trinta Antígona.
Poderia ser, poderia ter sido
Uma coluna, um feixe de luz no deserto
E um coro de vítimas que atravessa séculos.
Epílogo .

A chave na ignição, vidros partidos
O cheiro intenso de gasolina de muitos carros
Um ruído forte de escape, marcha atrás, cuidado
É tarde -
Para Aída para Antígona

Sem comentários: