segunda-feira, 6 de julho de 2009

A Fuga e a Viagem


Kandinsky, Fuga 1914

Viagem

Aparelhei o barco da ilusão
E reforcei a fé de marinheiro.
Era longe o meu sonho, e traiçoeiro
O mar...
(Só nos é concedida
Esta vida
Que temos;
E é nela que é preciso
Procurar
O velho paraíso
Que perdemos.)

Prestes, larguei a vela
E disse adeus ao cais, à paz tolhida.
Desmedida,
A revolta imensidão
Transforma dia a dia a embarcação
Numa errante e alada sepultura...
Mas corto as ondas sem desanimar.
Em qualquer aventura,
O que importa é partir, não é chegar.

Miguel Torga

4 comentários:

Joana Espain disse...

Adorei. Obrigada!

Angeles Sanz disse...

eu gostei muito também,
Ángeles

auxília disse...

Gosto do modo como Torga nos desinstala e sempre nos incita a "renascer". É um dos seus poemas que sempre selecciono para os "meus meninos" e que incluo nos documentos que para eles vou produzindo.

"(...)
Temos a primavera na lembrança;
Temos calor no corpo entorpecido;
Vamos! Depressa!
A vida recomeça!
A seiva acorda, nada está perdido!"

Miguel Torga, in "Antologia Poética"

Obrigada por mos (Torga e os seus versos) relembrar. Beijo.

josé ferreira disse...

Olá Auxília
Tanta sorte de quem é ensinado assim. Miguel Torga crava-nos o olhar rugoso e profundo e na voz cristalina dos poemas coloca-nos a bússola nas mãos,
acerta-nos o leme, reajusta a vida humana na leitura atenta da Natureza em que nada nunca se perde e tudo se transforma.

Obrigado pelos versos que aqui também me deixou.

Bjo.