sexta-feira, 13 de julho de 2012

Escrevia à mão a cidade - um poema de Filipa Leal


                                 Jaime Isidoro


Habitava da cidade
os lugares mais pequenos.

Limpava-lhe o pó,
pintava-lhe os cabelos,
escondia-lhe as rugas
(chegava mesmo a deitar-se
ou a deitar areia sobre as ruas
abertas).

Às vezes chorava-lhe no centro
a ausência,
ou matava-lhe os homens
que corrompiam os homens.
Por fim,
esquecia-lhe as feridas.

Escrevia à mão a cidade
e a cidade escrevia-se
sobretudo
no cinzento
no esquecimento.

Eram tão simples as palavras
da cidade,
mas complexos os amigos
que dela habitavam
os lugares mais pequenos.



Filipa Leal

Talvez os Lírios Compreendam
Cadernos do Campo Alegre, 2004  lido aqui

Sem comentários: