sábado, 30 de julho de 2011
a mulher, freud o gato branco e um poema antigo
Jose Merello "Mujer azul"
recuperar um poema antigo e deitar-me sobre ele
como se falasse e tivesse mãos, dedos, cabelos longos;
um poema de mulher
a mulher
de olhos ternos, eternos -
em Abril corriam os rios pelos sinais das nuvens
a janela estava fechada e os vidros tracejados de gotas;
escrevi-o como se cada palavra fosse um pedaço de roupa
a cair, a desnudar o corpo, o teu, o meu, ao mesmo tempo
e à distância; serás sempre, disse-o. chovia -
reli-o na primeira hora de um final de Julho.
caiu-me no colo como Freud, o gato branco
de olho azul não na cor de safira mas mais claro
encolhido na curva quieta da cauda e ronronando
como um motor de barco abrindo as águas e olhando o rio -
caiu-me no colo como se fosse uma canção de gôndola
um sole mio num canal de Veneza; um remo longo
uma camisola de algodão, às riscas -
caiu-me no colo e pronto, o inevitável morno rodopio
de um crepúsculo laranja macio e persistente
que pode ser miragem, pode ser desvario
pode ser tudo porque sentido -
é curioso observar a ladeira do tempo
o escorregar nas folhas dos versos como se de um Outono
o ultrapassar dos frios polares conservando o fluir do pêndulo;
os batimentos de fogo
e mergulhar no acaso do poema antigo
para o sentir presente e futuro
como um rumo e um destino -
30 Julho 2011
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