terça-feira, 15 de junho de 2010
cartas de presença - o pecado de uma ausência
Azul do Egipto (silicato de cobre)
descobre o cobre de cor azul
dentro de um frasco de pharmacia
elemento alquimista de um céu límpido
sem os brancos dançarinos – gotas de água.
descobre o sol saliente que levanta o algodão
quase pena branca de escrita lenta
num início de lençol de linho traçando a perna nua
uma onda que acentua a seda e a luz de saída;
colina alva de pele, energia positiva.
abre dois ramos, dois remos de ar, dois braços
acima. acima. estica o espírito, de gestos
gestos tensos, espasmos, arrepios,
pequenas pontas de alfinetes
subindo os degraus firmes a um lago adormecido
a um rolo de cabelo apanhado como um ovo
solta o pescoço e os olhos abertos
ou fechados, ao ritmo certo.
descobre o pequeno almoço, as torradas
como cartas de presença e o sumo de laranja
reinvenção de um néctar consistente
doce e fresco que se entrega;
cálice de veludo e permanência.
descobre como são únicas as migalhas
grãos de praia sobre o leito qual toalha
sobre o dia que se estende, quente
numa risca incidente na parte mais larga da coxa;
um sinal de desejo .
descobre que saí de madrugada
consternado na ausência já vizinha
como um gelo de Kiev, uma ventania invencível
que solta o corpo em partes divididas na estrada
qual fim de mundo de grau zero, de grau nada
pedra pesada na água que se afunda
depois do sonho, depois do sono tão profundo ;
e os dedos, os teus dedos, dedos leves de almofada
nos dois lados cara.
descobre que as horas não demoram
que o mar mediterrâneo pousa e espera.
que as algas presas e o nadar de costas moram
nas melhores ilhas, as desertas, sem procurar caravelas
a construir num pedaço de selva, um dossel
de lianas e ruídos e brilhos de folhas verdes,
restos de magnólias e cachos violetas.
descobre o cobre que me cobre de tinturas
separando cicatrizes, ternuras incompletas
as despedidas, as descobertas,as partidas equilibristas
os sons de lua e as estrelas das arestas.
descobre a lisura fácil dos poemas
nos estames das orquídeas, das prímulas
na esguia silhueta das sombras dos ciprestes
nas mandrágoras dos mandrakes
cobre-me de magia e paraísos;
homem água, homem fogo, homem tudo
a elevar planetas.
descobre o presente junto ao cravo
junto ao frasco de pharmacia mogno escuro
onde o cobre não se descobre mas azul
azul do Egipto, de Babilónias.
adivinho a inclinação do umbigo e a forma como ergues
o desenho simples, quase um esquiço
e um sorriso. adivinho a leitura de algumas linhas.
os lábios finos. adivinho.
descansa um pouco antes de continuares o livro.
liga o Cd pelo comando. sem o saber. descansa.
ainda cedo deitei comida ao peixe
enquanto preparava um pouco de geleia.
os gatos serenos sumiram na sombra das plantas.
as tartarugas esticaram as cabeças para olhar a glicínia
depois esconderam-se na telha portuguesa.
o Rui e a Luísa falaram no último projecto de um teatro
sobre modernidade e revolução, ao som da marselhesa.
reinscrição daquelas ideias que nunca completam
hibernam e voltam plenas de entusiasmo e emoção.
volto. volto cedo. muito cedo.
a tempo de colher as framboesas -
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