bocados vermelhos de ser
pequenas dobras livres
saltos esgrimistas lá dentro
à escuta
será que entrei
- devo ter entrado-
tudo à mesma marcação
eu o espaço
o tempo da palavra
a entropia
não trouxe nada
nada me enviesou
nem pássaros ou navios
só o mundo
em nó vermelho de mim
lembro água
ou areia ainda liquida
a desintegrá-la por precisar
e linhas em fuga de mim
que partem
como chegam olhos baixos
de rostos que habitava
e comboios
de encontros subitamente lúcidos
que não souberam parar,
e pele, sei que há pele
- ainda devo ter pele-
sinto-lhe o grito a transpirar
não trouxe nada,
encosto-me a ver passar linhas
em dolorosa minúcia de ti,
agarro a linha do tempo
e enrolo-a ao pescoço
na esperança que te repita em si
mas o fluxo desata a vibrar
a meada doba irritada
em vez de linhas, ondas,
a velocidade aumenta, deriva
o espaço das palavras
e já nada chega ou se parte
só elas a rir de mim
perdi os olhos,
a pele vermelha,
o comboio
e a precisão da areia
Não sei sair
à roda o tempo
fechou-me cá dentro
a um canto neste poema
3 comentários:
Joana gostei muito deste poema de "salto de esgrimistas" em que as palavras correm primeiro numa calma medindo a entropia, a desordem de um mundo , lá fora. Não há descontinuidades tudo parece natural até a mudança de ritmo no final que leva a entropia para dentro, para dentro de uma "roda" que acaba por "fechar", absorver para "dentro do poema".
destaco ainda imagens "comboios de encontros súbitamente lúcidos"e a " a precisão da areia".
Abraço
Desta vez mais longa a inspiração.
Gosto das linhas rectas que se transformam redondas. O grito a transpirar e de ficar presa no tempo e no poema. Bj Clara
Gostei muito deste poema em torno da ideia do tempo fundido em espaço -- e a des-inspiração por dentro. Gosto imenso dos versos
não trouxe nada
nada me enviesou
nem pássaros ou navios
Acho que consegue transmitir a ideia de um universo perturbante, em que "canto" e "canto" se anulam -- porque simultaneamente sugerem voo e liberdade e fechamento claustrofóbico.
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