Em tempos ouvia com frequência uma cassete (fita magnética inscrita da pré-história da tecnologia) de uma actuação ao vivo de Vinicius, Toquinho e o Quarteto em Cy. Neste registo havia lugar à poesia (a poesia também é um lugar... um refúgio que pelo menos a mim me preenche, dá espaço ao sonho e ao tempero das emoções) e havia uma sentida homenagem a Pablo Neruda. Dizia o grande poeta brasileiro :" malvado ano de 1973 que levou de uma só vez três Pablos, não três Pablitos... três Pablões" referia-se a Pablo Picasso, Pablo Casals e Pablo Neruda cada um em sua superior arte sem substitutos.
Nesta recordação resolvi publicar dois poemas que a voz inconfundível de Vinicius recitou na companhia (tantas vezes minha) dos acordes perfeitos de Toquinho e um coro celestial das vozes femininas do Quarteto em Cy, terminando na apoteose final de palmas (...e ruídos das gravações imperfeitas, alguns encravamentos que engoliam as fitas e obrigavam ao enrolamento manual com a ajuda de um lápis levando a fita à frente e atrás na esperança de conservar a preciosa cassete, o que foi conseguido).
Não vos chateio mais com conversa de "chacha", aqui vão os dois sonetos:
Soneto de homenagem a Pablo Neruda
Quantos caminhos não fizemos juntos
Neruda, meu irmão, meu companheiro...
Mas este encontro súbito, entre muitos
Não foi ele o mais belo e verdadeiro?
Canto maior, canto menor - dois cantos
Fazem-se agora ouvir sob o Cruzeiro
E em seu recesso as cóleras e os prantos
Do homem chileno e do homem brasileiro
E o seu amor - o amor que hoje encontramos...
Por isso, ao se tocarem nossos ramos
celebro-te ainda além, Cantor Geral
Porque como eu, bicho pesado, voas
mas mais e melhor do céu entoas
teu furioso material!
( 1960 )
De seguida Vinicius leu um outro soneto escrito em 1938 a bordo de um barco que o conduzira a Inglaterra. Chama-se "Soneto da separação" e foi aqui adaptado à partida do grande poeta chileno. ( algo que nunca acontecerá porque nos deixou a sua poesia )
Soneto da Separação
De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.
De repente, não mais do que de repente
Fez-se triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente
Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.
Espero que gostem!
Saudações poéticas a todos!
Nesta recordação resolvi publicar dois poemas que a voz inconfundível de Vinicius recitou na companhia (tantas vezes minha) dos acordes perfeitos de Toquinho e um coro celestial das vozes femininas do Quarteto em Cy, terminando na apoteose final de palmas (...e ruídos das gravações imperfeitas, alguns encravamentos que engoliam as fitas e obrigavam ao enrolamento manual com a ajuda de um lápis levando a fita à frente e atrás na esperança de conservar a preciosa cassete, o que foi conseguido).
Não vos chateio mais com conversa de "chacha", aqui vão os dois sonetos:
Soneto de homenagem a Pablo Neruda
Quantos caminhos não fizemos juntos
Neruda, meu irmão, meu companheiro...
Mas este encontro súbito, entre muitos
Não foi ele o mais belo e verdadeiro?
Canto maior, canto menor - dois cantos
Fazem-se agora ouvir sob o Cruzeiro
E em seu recesso as cóleras e os prantos
Do homem chileno e do homem brasileiro
E o seu amor - o amor que hoje encontramos...
Por isso, ao se tocarem nossos ramos
celebro-te ainda além, Cantor Geral
Porque como eu, bicho pesado, voas
mas mais e melhor do céu entoas
teu furioso material!
( 1960 )
De seguida Vinicius leu um outro soneto escrito em 1938 a bordo de um barco que o conduzira a Inglaterra. Chama-se "Soneto da separação" e foi aqui adaptado à partida do grande poeta chileno. ( algo que nunca acontecerá porque nos deixou a sua poesia )
Soneto da Separação
De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama.
De repente, não mais do que de repente
Fez-se triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente
Fez-se do amigo próximo o distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.
Espero que gostem!
Saudações poéticas a todos!
4 comentários:
Oh José,
Eu passei a minha juventude, não com as cassetes mas os cds do Vinícius e do Toquinho. E as cassetes também lá andaram, gravadas a tocar incessantemente no rádio do carro. Sei tantas músicas de cor...eu que não consigo memorizar nada. Do quarteto em Cy lembro-me de uma música arrepiante: Canto e contraponto. Obrigada pela lembrança que me fez resgatar (agora já não do cd nem da fita, mas da pasta do pc) estes verdadeiros poemas musicais.
Gosto de muitas músicas mas a brasileira tem um lugar especial. Também decorei muitas delas e sempre me surpreendi com os versos de afectos no outro lado do Oceano.
A música de cordas tangidas e acordes "de amores desafinados" sempre me tocaram a alma e despertaram em mim as primeiras poesias. Nos teus poemas, como já disse em alguns comentários, nota-se esse ritmo e essa melodia davam boas canções de "bossa nova".
Fico contente com o repescar nas pastas do computador dessas melodias e eu vou continuar a fazer o mesmo: à procura das boas memórias e a exorcizar as menos boas.
Voltaremos a falar dos brasileiros!
Até breve!
de repente da ausência fez-se a presença
e do silêncio fez-se a música
de repente da solidão fez-se a viagem
e da asfixia fez-se o grito
das memórias, dos afectos.
Obrigada, José. Pelos sonetos. Pelos poetas. Pela música. Pela magia das palavras. Uma boa ajuda para uma semana que começa (mais tarde),mas com muito trabalho! Até breve.
neruda....
obrigada por partilhar este mar de poesia.
bj filinta
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