sábado, 7 de maio de 2011

Retábulo de noções primordiais



São as noções que fazemos um do outro que se despem, nós não. Nós apenas observamos com desespero, poética de espelho e malícia o corpo nu das noções, as suas inúmeras vilosidades e axilas friccionadas. E a forma como elas se confrontam na ofensa que o desejo fixa, na noite do olhar mais árido. Nós somos só os convidados das nossas noções, os escravos vestidos ironicamente de convidados das nossas noções, e por vezes até nem isso, nada mais do que a pretensão opaca da indumentária.
É como que se tivéssemos levado as noções que ambos fazíamos um do outro a uma festa com piscina, troca de casais, alguma esperança de certa forma atlética na sua convicção de derrocada e o rasto de drogas finas e tentaculares. É como Marte, essa nudez aplicada ao outro com uma sede de esboços retrospectivos e escaparates, ponte móvel de si para si, para deixarmos passar o navio

sem sentido


sobre o mar de nada.

2 comentários:

Elza disse...

Gostei da imagem de que são as noções, fora de nós, que fazem certas coisas. Mas assustou-me o desespero de nos ver assistir a isso, e ainda mais o vazio sem sentido que afinal foi.

Joana Espain disse...

Olá André

Pontes móveis, espelhos, narrativas de narrativas e bichos sozinhos com 'noções que se despem'. Parece-me bem levar as noções dos outros à festa, na mala, passadas a ferro, prontas a ser ponte ou margens entre nós.

Gostei muito.