segunda-feira, 24 de janeiro de 2011
- da existência dos sonhos
Henri Rousseau
O sonho tem estas árias misteriosas
que acompanham as manhãs frias
músicas muito antigas numa voz rouca e sensível
com andas de mãos grandes encaminhando os pés
uma corrida num monte limpo
na fuga imprevidente de uma aula incompleta
um abecedário esquecido, um pó sem origem
um filtro de realidade, filtro branco gotejante
de segundos, nos ponteiros pálidos da nebulosidade.
os passeios são os mesmos na cidade, a inexistência de garças
os vapores na frente dos lábios, os mesmos, breves
transformados no próprio ar químico, vaga irrealidade
repetindo, repetindo sempre sem dar lugar à consistência
porque é essa a natureza, o lugar escondido
o lugar escondido.
são os mesmos os passeios da cidade na manhã fria
e não consta que cheguem hoje, segunda-feira
os extraterrestres do destino desenrolando papiros
afirmando cronologias definidas, passos certos de uma dança
atrás à frente, de lado, vira agora, não consta.
e o café, que é o mesmo, preto de anfetamina, vibrando as células
ainda adormecidas, surgindo como vício, o vício dos dias
solta as livres letras como um fumo desprendido
uma associação livre, uma leve transparência de um mundo inconsciente
sem a percepção de o quanto a dosagem, a mistura, a percentagem
de açúcar e farinha que sobe de dentro, conduzindo
empurrando o aparo, soltando a tinta, tisnando um pouco as figuras de estilo.
hoje, segunda feira, 24 de Janeiro, os passeios são os mesmos
e não ouso interromper esta ária de segredos, dentro, os sonhos
não ouso desapertar totalmente os laços de uma fita
semi-aberta, semi-fechada, dourada e brilhante
observo-os na felicidade constante de uma oferenda
de um outro dia vinte e quatro, dentro de uma meia
junto a pedras ainda ofegantes de cinza, a lareira
e o entusiasmo de saber que existem e estão lá dentro -
os sonhos não são como os passeios da cidade
nem sempre são os mesmos, às vezes surpreendem
quando surgem como um quadro naïf, uma ingenuidade
na cor verde do exagero, originais, provocando o sorriso
na realidade dos dias -
José Ferreira 24 de Jan 2011
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