terça-feira, 21 de dezembro de 2010
Alexandre Bloom
Alexandre Bloom é um grande coleccionador de despedidas. Começou por sentir um prazer rasante, porém incerto, perto da palavra adeus no dia 23 de Outubro de 1955, enquanto se despedia do senhor da loja de ferragens epónima – Augusto Kunh –, onde costumava entrar regularmente, apenas para pousar os cotovelos no balcão de madeira e sentir, com os dedos polegar e indicador unidos, aquilo que ele acreditava ser o idioma débil do serrim.
Nesse dia, contudo, ao despedir-se tranquilamente do senhor Augusto Kunh como de costume, Alexandre Bloom sentiu o tal formigueiro nas imediações da palavra adeus mal a proferiu, como se de dentro da palavra adeus chegassem agora aos seus ouvidos os ruídos abafados de uma festa semi-clandestina, como se as portas blindadas da palavra adeus não fossem suficientes para insonorizar o barulho ensurdecedor dessa festa, para a qual – propôs Bloom – todos os convidados deveriam atender ao dress code e levar vestido alguma peça de roupa trágica e imaterial.
Apesar de todos os esforços para entrar na festa que se prolongou durante toda a noite de 23 para 24 de Outubro de 1955 na palavra adeus, Alexandre Bloom nunca conseguiu distinguir muito bem de onde é que vinha o tal barulho e acabou por não encontrar a entrada de emergência da festa, embora tivesse ao longe ouvido os distúrbios causados pela música alta dentro do seu desejo de a possuir.
No dia seguinte, Bloom voltou à loja de ferragens de Kunh só para poder despedir-se dele (“Olá, Senhor Kuhn; adeus, Senhor Kuhn”) e, com isso, accionar a festa (para a qual nunca resgatou nenhuma possibilidade de convite), e deixou definitivamente de lado a história do serrim.
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