sexta-feira, 29 de outubro de 2010

perguntas-me sobre o tempo


(fotografia retirada da internet de autor desconhecido)


conceito estranho
sequência e réplica que perdura, única
único, de muitas páginas e actualidade
na precisão imediata : mesmo agora
naquele dia, naquela hora –

no salão de chá dos jardins de Serralves
um sopro traz a Rotunda
uma aragem traz o Palácio
um Natal a cumplicidade de uma rua de baixa
uma prenda de artesanato;
um pássaro preso de mola
sobe de forma manual
desce em cadência automática
e aponta: tira, fica, rapa e põe

o pinhão da pinha do pinheiro de uma área protegida
junto ao reboliço do mar onde areia em movimento
e a cápsula de dunas, em socalcos redondos e flores de cactos –

a memória é um relógio isócrono que recorre e circula
de espírito presente, um vudu de fumo dentro
que ressuscita no contemporâneo
a antiga semente –

uma Páscoa a oferta de um desejo
uma chave, um apartamento
a pressa de alguns mantimentos numa loja conveniente
duas latas de refrigerante, duas sandes de não me lembro
adams amarela , pastilha elástica, uma barra de chocolate
a prata enrolada numa bola, de quatro em quatro
a inscrição azul da paisagem, um lago na Suiça, a doçura derretida –

um facto : caíram as torres gémeas
depois as múltiplas verdades, de cada um em qualquer lugar
o momento quando os media escrevem no vidro magnético
a fusão majestática, sem remédio, a nuvem de pó
na América um rosto incrédulo
na Arábia o regozijo de uma barba afiada.
por cima de uma cómoda, no quarto
as imagens como cartas de um baralho
um jogo de pares, ouros e copas, paus e espadas –

os minutos, as horas, os anos
não possuem o dom da transparência
há enseadas fora de tempo –

e silêncios escondidos numa praia
mãos de gaivotas em roupas de inverno
botas descalças, gotas salgadas, um mar
a lisura inquieta e húmida após a fuga das ondas
o horizonte nos espelhos de mercúrio

e em cada gota de sangue, o tempo
o tempo do pêndulo, alinhado no equilíbrio
de uma dança, uma canção de búzio:
presente presente
passado passado
futuro futuro

único, inédito, inamovível –

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