Ode Gente*
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O tempo, perverso em não existir, conjunto de limões em fuga,
com a sua saia de séculos, a masturbar-se lentamente,
A vir-se Em todas as direcções:
Depois mais rápido moldando a cara dos lavradores
Ofegante na sua vontade circular
Cilíndrico na espera – a subir o Chiado a descer o Chiado,
A entrar em cada casa, a passear na Afurada – a saber-se coisa-nada
ele
dá-te a mão, Espera,
Pinta frescos na sala, detiora os frescos da sala
tacteia nas tuas costas uma vontade nova, muda essa vontade
cria uma nova e uma nova e uma Nova
Escreve a lápis número 3 na sua sebenta:
“Este país não é para velhos” E masturba-se devagar e
depois Rápido: E adora Cláudio Magris e toda a Antena –
e acorda com Sebald e deita-se com Sebald, viola as filhas da revolução
e é manhã e insónia a entrar em todas as tabernas
a tingir de amarelo os calendários Michelin
a crucificar este, a encher de prazeres aquele, a masturbar-se
ciclicamente até ser só Vontade de ter passado:
Tempo-Cidade, tempo-cavalo, tempo-proletário,
tempo-homem, tempo-mulher, tempo camponês que dá a mão, tempo que escreve ensaios, tempo que canoniza –
Tempo que chora leite condensado para
cima da Sebenta, com o seu rosto quadriculado que é só medo e está passado –
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Tempo que é União e fala por nós, que tenta chorar mas só lhe sai musgo dos olhos, fresco e verde como o que cresce nas fontes de Raguzza, que dão uma água carregada de ferro (Resta-me a Sinceridade e a Saliva de todo o mundo)
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O Tempo a cavalgar com Zaratrusta, trusta trusta,, a procurar um efeito sonoro nos seus versos: Em busca deste ou daquele recurso estilístico que dê profundidade à rima imperfeita – a Injectar no peito uma vontade nova, um Sol líquido entre dois seios que são também montanha, onde descansa o olhar –
vários olhos que vêm os estorninhos dançarem numa nuvem única, que parece uma cabeça de Medusa, em permanente mutação: Criando novas formas do cabelo, novas expressões no sorriso …………….. Uma nuvem única que faz amor consigo própria, como se fosse com um filho por cima dos Campos de Marte - uma nuvem-estorninho a acompanhar Grieg na subida e a acompanhar Grieg na descida: Nasceu uma Estrela com baton a mais –
A Torre de Babel, as torres do Aleixo
A torre latina que só espera,
a doçura do
teu queixo – À procura da T-mésis per-fei-ta
Um triângulo com as suas três pontas acesas, que bebe demais e tem medo de cair na entropia, um triângulo-cio com problemas de erecção.
É só doçura a torre latina que cai, Gémea do silêncio e da solidão;
A nossa língua não é esquecida: Evoluirá até à deformação perfeita –
O Tempo a acender todos os interruptores da Calábria, a fechar os olhos aos missionários que merecem o descanso: A dar-lhes um sentido porque todas as coisas devem ter sentido, seja ele único ou múltiplo: Seja ele cavalo, cidade-industrial, pastor alemão, vidro, sebenta, aguardente, erecção, uma viagem a Nova York, a Grécia Inteira; seja ele vento, microscópio, lixívia de marca branca, rebanho de ovelhas, medo do escuro, uma canção de amigo, uns olhos verdes e tristes – Seja ele, fazer obras num talho, mudar de instalações o sapateiro, o preço da gasolina, o preço do trigo, o que o colhe, ou o que o come…
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Aqui não há espera: Come o teu queijo gordo e guarda que o teu lamento não seja eterno ………. Abre todas as janelas e deixa que o mar entre em tua casa – Nasceu do lodo, a simetria, a Vontade nova, em tudo nova; Não lhe quis dar um nome. Por superstição, deixei-a também flutuar como fumo de um cigarro que desaparece e é só instante. Deixei-o ir acordar os camionistas que seguem por estradas sem curvas, e precisam de dormir ……………………………… O que nos é estranho é adocicado e múltiplo, o que nos é estranho é o que Entra … Digo Entrar. Entrar Verdadeiramente::
Fomos alguém à janela com as suas pernas de cimento, fomos o pão negro que comia, um país na direcção do vento: O meu trabalho é partir diamante com a boca e encher de calmantes toda a Escócia e a gente austral. O meu país é só vento e aproxima o bem do mal: O meu país faz compotas de petróleo cristalizado, compotas de moral e de cimento que acordam os seus filhos pela manhã, compotas que indicam uma rota nova, que pedem boleia aos camionista, que têm medo de não passar bem a mensagem – É sua missão passá-la … Dizem - Bom dia! – A este e aquele que passa, que tiram o chapéu educadamente; Que abrem os seus corações aos estranhos nas estações de comboio. Compotas que desejam mesmo um bom dia, a este e aquele viajante e só esperam que a sua rota seja perfeita.
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Espero que alguém se deite comigo, e não saiba já se está acordado ou a dormir e que a fronteira entre a vigília e o descanso seja só um novelo com que brinca um gato, em tudo exílio e olhos verdes, um gato negro que entra e sai das torres latinas. Um gato com o sonho Americano e a Dormir por si adentro.
Manter vivas todas as Frentes e velar para que nunca se apaguem – Calcar um triângulo de espera - gelatinoso como o cancro da mama - Um Triângulo que incomoda os séculos, um triângulo que minga quando as pessoas se abraçam: um triângulo que acorda e cavalga, um triângulo que sabe três línguas e assassina por trás. Um triângulo-Solidão.
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Em métrica antiga abrimos todas as portas para que o rio passasse, negro e gorduroso no seu leito, a dizer que o país não se mete em sarilhos, em cada esquina um tétrico coro canta. Em cada esquina essa perda de cabelos dourados, wireless latino e agudo, entra em todos os jardins, come os teus figos maduros, Quê?
Com uma flor na lapela que é o seu lamento,
A criar estilos, a passear o cão, a ouvir o concelho de todos, a dançar regeton
O Tempo a ouvir Sitiados
A talhar a pedra - a ser já só pedra e dados
a construir sólidos telhados num labirinto guloso
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O Coro tétrico canta:
Tudo é febre e mudança
Panteão e virilha a arder,
Tudo é promessa líquida que muda,
e manequim a ferver
Tudo é perspectiva múltipla e
nos exige a atenção,
Tudo é língua, tudo boca ,
Ode como um cão!
Esculpe-me o cabelo, o sexo e o antebraço,
Recheia de chocolate os ouriços do mar, Dá-me a solução num único abraço,
Adoça e esculpe-me os limites: Faz deles, nenhum.
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Acende um Farol em cada praia. Não esperes os navios. Entra em todos os seus porões sem aviso - Recheia os capitães de Susto – Enche os Porões de riso e espasmo… Penteia-os com gel de golfinho. Sempre estive perto da loucura, se não fui ela própria, sempre quis ter bigodes púrpura e ser só a chuva lá fora –
Nunca quis ser um poeta, só quis ser um navio em chamas: Um navio violado pelo seu tio, todas as manhãs e todas as tardes, um navio que há noite lê Bataille - Um Navio que se afasta dos outros navios se não tiver cuidado, um navio que só quer ser ponte, limite e União. Um navio que com os seus óculos de Sol, escreve na sua rota: - Não existe o que se escreve nas rotas -
Um navio que mesmo assim escreve e insiste em escrever, seja no osso de uma namorada morta, seja no computador, seja em rolo de papiro, em pergaminho, em papel, em folha de gelatina, em mármore, em porta de casa de banho, em quadro (pode ser com unhas ou com dentes) em areia molhada, no braço em tatuagem, nas costas em tatuagem, num deserto mexicano, num campo relvado, a chantilly num bolo de chocolate, no lodo, na lama, no gelo com patins, na cerâmica, na argila, no fogo, desenhando um rasto de gasolina, com urina num ladrilho seco – Não interessa o suporte, mais ou menos perene, ele só prova a nossa inocência, a nossa necessidade de partilhar - A literatura, só pode ser União …………… Um navio que escreve rápido no ar e em fumo de cigarro (são precisos bons reflexos e ante-braço forte) – A Literatura tem de ser União –
Nunca quis ser um poeta, sempre quis ser um espelho colocado no centro da Austrália, sempre quis ser a “fome de gente” que os espelhos têm - Pequenos fios dourados, Guardar uma coisa qualquer, um hipermercado, um segredo, proteger essa coisa dos lobos; Ser vários cangurus espalhados pelo deserto reflectidos na minha cara fosca, de um e do outro lado, uma cara fosca que é só deserto espelhado carregado de nuvens vermelhas no vidro e na sede de ter Muitas Línguas - Deserto Compositor a Criar um Requiem em Braille para que os cegos cantem uma Osana Perfeita – Para que os cegos a vejam multiforme a Afastar todas as nuvens carregadas – Para que a Fuga seja só ficar – Deserto a vestir as suas cuequitas com motivos ursinhos, a olhar para mim, espelho que não dorme porque abre todas as gavetas, todas as vontades para tirar de lá meias de licra – Sou só a vontade dos teus olhos. A Escócia a abrir trincheiras cor de rosa, África a sonhar com um incesto – Em tudo Maior –
A calçar as All-Stars - A jogar playstaition com a boca cheia de limão* Deserto a cavalgar a abrir portas – Não interessa a escolha do caminho, mas a intensidade com que se o percorre, seja ele um ou em tudo múltiplo e comprido. Deserto a abraçar deserto, deserto a espalhar-se vermelho na perda por deserto e deserto, deserto com sede de pessoas.
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Nunca quis ser um deserto, sempre quis ser um espelho ou um conjunto de limões _ Se fosse uma mulher, paria um espelho de espuma – Sei que a espera é o próprio Inferno, senão o Diabo Inteiro, sou o arquitecto de um labirinto:
Comer o labirinto
Sair
Ficar dentro – O Arquitecto é uma sombra e quer-se perder e espalhar pela praia ao fim da tarde, Criar a Sua Perda, um labirinto doce com muros que são folhas de gelatina, um arquitecto que só te quer a ti, todas as saídas e todas as entradas. A mais doce ária que é o azeite negro a escorrer pela boca de um paralítico. Esculpe-me o cabelo, o sexo, o antebraço, dá-me um abraço triplo, tira-me todo o ar, dá-me todo o Ar:
A noite com as suas cuequitas apertadas uiva por Maiakovsky
a língua da noite adormece os pescadores
Gosto de te ver sorrir*
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O Riso é o Gerador Único do Universo,
só ele, quando, tudo o resto falha, permite que as estrelas,
(infanticidas por natureza), se mantenham vivas e não cortem as suas pontas,
Que as ligações frágeis, não percam vida e se extingam até à anorexia, perdendo luz e força,
ou se arrebentem por dentro sobre o seu próprio eixo desatinado (desatinando para aqui e para ali) Só o Riso é Deus, só ele cavalga e Molda verdadeiramente as caras,
só ele cria luz e espelhos de espuma, só ele goza a poesia, só ele fica sozinho, só ele dá vida.
Quem escreve “O Fim da História”, mais não faz do que a começar. Sou um recurso estilístico a olhar-se ao espelho, a beber chá verde pela manhã, a empapar o cabelo em gel …
Sou a vontade, em tudo malhada, de te ver sorrir*
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Lambi o sexo a um relâmpago de virilhas acesas
os seus pintelhos tornaram-me a boca da cor do azeite,
alguns engoli e escorri para os pulmões, vi o relâmpago a lavar os dentes e a cair por cima de uma biblioteca
a literatura (a primeira morte) só serve para unir – os fios que usa são dourados,
é também dourada a sua paciência e a sua vontade de conhecer o inferno.
Ode em mutação, poema recheado de vento, poema que cavalga e é lusitano - Que é só sede e é só vento, (vontade de rir de tudo) - Poema em rima cruzada a atravessar todos os rios, relâmpago a guiar numa auto-estrada em direcção ao sul – Poema a ouvir Belle Chase Hotel com a boca cheia de cerejas negras – Ode que canta um país que não quer amanhecer, e que é brisa e triste lamento, poema que é olhos teus e se alimenta de riso. Ode cão Ode cimento.
Sempre quis ser uma cidade industrial escocesa que Turner não conseguiu pintar, sempre quis ser o acordar dos operários, que calçam as suas ceroulas, afastam o medo (Criação Absoluta e único Motor de tudo) Todos os mails não enviados que recheiam a Rede de pontas gelatinosas e fazem explodir as estrelas – De tudo o que deve ser dito com o palato aceso.
Ode Gente, Ode canção
Ode lixívia que limpa uma campa
Ode-saia e alexandrina na rima, ode com dentes podres
viciada em cocaína – Ode Gente dentro de Gente, Ode cantina,
Ode canção, perfeita no gesto – Ode hospedeira da Easy jet, Ode-gente que chove, Ode-Nuvem que tapa e destapa as cidades Belgas, Ode a abrir os frascos de mel todos, a meter-te pirilampos nos cabelos, a acender de escuridão a noite – Ode que chora quando morre o seu amigo, Ode que brilha quando morre – O Mundo começou agora e já está na sua varanda de Susto uma rapariga com a sua saia carregada de vermelho – Ode Saída a encher os pulmões de relâmpagos - Um país Ocidental que nasceu numa paralítica dança em construção.
Ode tinta num copo de espasmos, Ode de boca ao lado que precisa de um amigo,
perversa na fuga e na chegada
- O amor é como carne …
Nuno Brito
2 comentários:
Olá Nuno de novo os universos delirantes de revoltas chocantes, inusitadas em prosas de poética forte. A espaços há uma acalmia mas logo voltam os incêndios permanentes.
Abraço
Uma delícia embarcar nestas viagens. Adoro a ironia e a vertigem assim de entranhas de fora constantemente (o gozo com o cânone e a textualidade, julgo que gozo é a palavra certa). Chega-se ao fim espancado mas um pouco maior. Caramba!
Obrigada
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