segunda-feira, 8 de junho de 2009

para quê enviar-te uma carta

Para quê enviar-te uma carta se estás aqui ao meu lado, para quê.

Porque não me quero ouvir declamar as falas de um discurso

decorado em antemão, decorado, que já não sinto

sequer, mas tenho que to ler em sílabas completas

sem o choro dos passados partilhados.

E naqueles tons eu vou deixar-me aceso em lenta vida,

em lenta vida naqueles tons monocórdicos aos quais me rendi

sem a tua presença radiante. Para quê enviar-te uma carta.

Talvez me sinta mais homem. Talvez. Aquelas palavras brutas

e animalescas que te chamo nas ideias estão lá, aquelas palavras

únicas que eu não digo porque te ferem, frágil que és, te ferem

até à medula do teu ego. Sentir-me-ia mais homem porque

não te teria de olhar nos olhos. E olhar-te dói.

Dói-me ao respirar-te, ao ouvir-te falar, ao chegar-me a ti

e saber que não te posso encharcar de amor, dói. 


David Campos Correia

1 comentário:

josé ferreira disse...

David é um poema que respira de forma fluída. Gostei muito. Parabéns pelo poema e pelo livro.